abril 26, 2010

Marina Silva falou sobre a construção da usina de Belo Monte em entrevista ao 'Terra'

A pré-candidata à presidência do Partido Verde (PV), Marina Silva, esteve no último fim de semana e nesta segunda-feira em Washington, nos Estados Unidos, para participar das celebrações do Dia da Terra (25 de abril) e se reunir com ambientalistas e representantes do governo de Barack Obama, a fim de discutir temas relacionados a meio ambiente e mudança climática.
A senadora também se encontrou com James Cameron, diretor de Avatar, filme recorde de bilheteria da história do cinema mundial, a pedido do cineasta canadense. Durante a estada na capital americana, Marina Silva concedeu uma entrevista ao Terra e falou sobre o projeto Belo Monte, matriz energética e o envolvimento de estrangeiros nos assuntos relacionados à exploração de recursos naturais no Brasil.
Terra - A senhora apontou vários problemas com respeito à construção da usina de Belo Monte, na bacia do Rio Xingu, no Pará. A senhora é totalmente contra o projeto?
Marina Silva - As coisas não são tão simples assim. O Belo Monte é um projeto complexo que vem se arrastando há mais de 20 anos. Foi dada uma licença com denúncia de forte pressão política, inclusive o diretor do IBAMA se demitiu no processo da licença. Os mesmos problemas que foram denunciados 20 anos atrás pelos movimentos sociais, pelos índios, pelo Ministério Público, permanecem até hoje. O que defendi foi que não tivesse sido feito o leilão, que o leilão fosse suspenso até que todos os aspectos de ordem social e ambiental e da viabilidade econômica do projeto fossem devidamente tratados. Se viável, obviamente o empreendimento deve ser feito. Se não é viável, não deve ser feito. Esta é a questão que eu levantei.

Uma alternativa que vem sendo discutida é que o governo brasileiro tem uma atitude de tratar a questão energética apenas pelo lado da oferta, não faz o gerenciamento da demanda. O empreendimento de Belo Monte, no seu total, é em torno de R$ 30 bilhões. Se usarmos R$ 20 bilhões em programas de eficiência energética, podemos ter energia equivalente a mais de dois Belo Montes, sem precisar de investimentos que têm este caráter duvidoso. Só para falar de uma alternativa. Mas é óbvio que é preciso um grande investimento na parte de diversificação da matriz energética, e temos potencial para isso.
Terra - A senhora concorda com especialistas que dizem que o Brasil não explora nem metade do potencial hídrico nacional? Que outras alternativas poderiam ser exploradas?
Marina Silva - Não falo só em relação ao potencial hídrico. Estou falando de uma matriz energética diversificada. A maior oferta de energia do Brasil é de hidroeletricidade. Temos outras fontes de geração: eólica, solar e os próprios agrocombustíveis. O potencial hídrico pode até estar levantado, mas não existem projetos. Fica muito difícil ficar falando em cima do genérico. Existe potencial? Sim, mas não temos projetos. Os projetos são sempre de última hora e, mesmo os que já vêm se enrolando há longo prazo, como é o caso de Belo Monte, têm uma série de problemas que não foram resolvidos.

O grande potencial de energia do Brasil é de hidroeletricidade - 64% está na Amazônia. Mas, obviamente, a gente não pode olhar apenas pelo lado econômico. É preciso responder a todos os aspectos: ambiental, social e do ponto de vista econômico. Depois de fechar esta equação na sua totalidade é que devemos verificar empreendimento por empreendimento e uma nova metodologia de licenciamento. Não o empreendimento em si. É preciso olhar para a área de abrangência do empreendimento. Tem que olhar para a bacia hidrográfica. Sem isso, haverá um acúmulo de problemas para cada empreendimento que surgir.
Terra - O que a senhora pensa sobre a atitude de indivíduos e instituições de países que exploraram de modo predatório suas reservas naturais em nome do crescimento econômico opinarem sobre as decisões do governo brasileiro nesta área?
Marina Silva - Pessoas de boa fé existem em todos os lugares do mundo. Pessoas contra a preservação do meio ambiente há no Brasil, nos Estados Unidos, na Europa, no Japão e em todos os lugares. Pessoas que têm uma visão responsável em relação ao meio ambiente, há nos Estados Unidos, no Japão, em todos os lugares do mundo. A gente não pode medir as pessoas pelos seus governos nem por suas empresas. Cada indivíduo tem o compromisso que tem, a ética que tem e as manifestam democraticamente onde vivem.

Eu vivi uma experiência, há 20 anos, em que o Chico Mendes, quando defendia sozinho a Amazônia, era acusado de ser contra o progresso, o desenvolvimento e a soberania brasileira e foi assassinado por defender suas ideias. Existiam poucas pessoas no Brasil, e fora do Brasil, que eram nossas aliadas. Lembro que quando ele (Chico Mendes) foi assassinado, não tínhamos o apoio de políticos brasileiros, mas tínhamos do vice-presidente (dos EUA) Al Gore. Então podemos encontrar pessoas comprometidas em todos os lugares do mundo.
Terra - O diretor de cinema James Cameron é uma dessas pessoas comprometidas com as questões de meio ambiente?
Marina Silva - Com certeza os temas que James Cameron está levantando são relevantes. O filme que ele fez (
Avatar) busca sensibilizar as pessoas para algo que muitas vezes elas não veem. Elas fazem apenas um cálculo pragmático e, às vezes, oportunista das questões. É muito mais fácil ficar do lado de quem faz a pressão pelo dinheiro e pelo poder do que dar voz e visibilidade para aqueles que historicamente são invisíveis e são explorados em seus recursos e destituídos na sua forma de viver, como os índios e as populações tradicionais.
 

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